Jornal de Brasília: Gripe suína: dúvidas e medos

A grande preocupação hoje é se a gripe suína tem potencial para ser uma pandemia. Sim, ela pode virar pandemia pois, ao contrário da gripe aviária, a transmissão é de pessoa a pessoa. Aviões potencializam a transmissão; em poucas horas um portador do vírus atravessa o mundo. O próprio avião facilita o contágio. Mesmo antes dos primeiros sintomas, um portador do vírus pode transmiti-lo pelo ar ou pelas mãos.

Com grandes cidades, grandes aglomerações urbanas, a disseminação do vírus pode ser rápida no Brasil, com muitas mortes. Há ainda (a maioria das pessoas ficam doentes e se recuperam da infecção) as perdas de dias de trabalho, comprometimento do dia a dia das escolas e, do ponto de vista psicológico, o pânico e o medo da morte.

Nunca tivemos uma pandemia respiratória, de proporções semelhantes à da gripe de 1918, depois do surgimento da vacina da gripe e dos antivirais. Portanto, muitas especulações são possíveis, desde a mais alarmente (“vírus sem controle, com muitas mortes”) até as mais otimistas (“temos vacinas e medicações que antes não existiam”). Na realidade, este é um cenário desconhecido, totalmente novo. Só o tempo dirá se as precauções foram exageradas ou se estávamos despreparados para este evento.

O importante nesse quadro alarmista é que o Brasil tem condições de combater de forma eficaz essa epidemia. Drogas antivirais estão estocadas e temos o potencial de lidar de forma positiva com esta situação. A forma como o Brasil lidou com a epidemia de Aids, além das campanhas de vacinação, são exemplos de que o nosso país tem condições reais de diminuir o impacto de uma infecção preocupante.

Neste aspecto é importante a população colaborar. Os cuidados básicos são os mesmos dos orientados para se evitar o contágio da gripe, ou seja, evitar aglomerações, lavar as mãos, tomar a vacina antigripe (apesar de não sabermos ao certo se isto é eficiente para esta epidemia), e procurar o médico se aparecerem sintomas respiratórios em quem acabou de viajar.

Essa crise vai desencadear muitas atitudes e reflexões. A primeira é em relação aos cuidados de uma epidemia que atinge pessoas de todas as classes sociais. Isso é bom pois reforça as medidas de proteção da sociedade em relação à prevenção de doenças respiratórias, estoque de vacinas e medicamentos e pesquisas para novas drogas. Por outro lado, pode ser encarada como negativa, pois tira o foco de doenças que acometem as classes menos favorecidas. Morre-se mais de doenças passíveis de prevenção, mas que atingem pessoas pobres. Malária, Doença de Chagas e Esquistossomose são alguns exemplos.

A segunda reflexão está relacionada ao simbolismo de uma doença de grandes proporções. Isso mexe com nossos medos e o mais básico de todos é o medo de morrer. Infecções como essa gripe suína deixam explícita nossa fragilidade e finitude. Há muito se espera por uma grande infecção, descontrolada, como a que aconteceu no fim da Primeira Guerra Mundial. Alarmistas ficam excitados com a possibilidade de estarmos próximos do fim do mundo, mas a verdade é que a ciência evoluiu e tem condições de lidar relativamente bem com esse problema.

Raul Emrich Melo é doutor em Medicina,
especialista em Alergia-Imunologia e
pesquisador da Unifesp

Fonte: Jornal de Brasília

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