Correio Brasiliense: CNMP busca um norte

Conselho do Ministério Público coleciona decisões contestadas no Supremo e enfrenta falta de estrutura administrativa

Roberto Gurgel: o procurador-geral da República assume a Presidência do CNMP ciente dos problemas enfrentados pelo colegiado
O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) tenta encontrar rumo. Criado há quatro anos, o colegiado responsável por acompanhar a rotina administrativa e analisar a conduta disciplinar de funcionários e procuradores volta aos trabalhos em agosto sob um clima de incerteza. Por causa contratempos no Senado, responsável pela sabatina dos novos integrantes, apenas dois dos 14 conselheiros estão aptos no momento para atuar. Além disso, o recém-empossado procurador-geral da República, Roberto Gurgel, assume a Presidência do CNMP ciente de que encontrará um baixo orçamento e uma estrutura burocrática acanhada para desenvolver o trabalho. Não bastasse isso, importantes decisões tomadas pelo colegiado têm sido anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de recursos.

Desde a quinta-feira, a reportagem tentou conversar com um representante do colegiado sobre os problemas do CNMP. Não há um interlocutor. É um indício da falta de norte da instituição. O conselheiro Francisco Maurício, único integrante no cargo da composição anterior, é avesso a entrevistas e não quis falar pela instituição. Roberto Gurgel, por sua vez, estava em viagem. Outros 10 conselheiros assumem as vagas somente no próximo dia 10, depois que o Senado, imerso numa crise política, demorou aprovar a indicação deles.

Duas vagas, porém, continuam em aberto. O Plenário do Senado barrou as reconduções do procurador Nicolao Dino e do promotor de Justiça do DF, Diaulas Ribeiro, para mais dois anos de mandato. A decisão legislativa, tomada em votação secreta, foi vista por procuradores como retaliação ao Ministério Público. Ainda não está definido se Dino e Diaulas passarão por uma nova votação ou se novos indicados serão sabatinados pelo Senado. A vacância dos conselheiros acarretou um acúmulo de 270 ações à espera de julgamento no início de julho.

O CNMP conta com orçamento de R$ 13 milhões para 2009 e um corpo burocrático de 83 funcionários. A situação já foi pior. No início das atividades, em 2005, contava com apenas cinco servidores e funcionava em salas cedidas pela Procuradoria Geral da República. Só em março de 2008 mudou-se para uma sede independente, mas alugada no Lago Sul. O colegiado aguarda a nomeação de 39 funcionários para reforçar a equipe. É inevitável a comparação entre o CNMP e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), nascido na mesma época para desenvolver atividade semelhante no Judiciário. A começar pelo orçamento. O CNJ tem R$ 122 milhões para gastar em 2009, quase 10 vezes mais que o colegiado dos procuradores e promotores.

Transparência

Outro dado relevante é o nível de aprofundamento das informações. Em 20 de julho, o CNMP divulgou relatório sobre o desempenho dos Ministérios Públicos estaduais no ano passado, exigência prevista em resolução. Das 27 unidades da federação, oito não enviaram dados sobre julgamento de ações penais, cíveis e representações. O Ministério Público do DF está entre eles. O conselho também não dispõe de dados para acompanhar o andamento de processos desde a primeira instância até os tribunais superiores. No CNJ, por sua vez, já se discute até a taxa de congestionamento de processos — quanto tempo cada processo fica na mão de um determinado juiz para ser julgado. No MP, não se sabe quantos processos cada procurador tem em mãos.

“É um contraste brutal”, afirma o diretor executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo. Para ele, apesar dos importantes serviços prestados pelo Ministério Público desde a Constituição de 1988, a instituição ainda é uma “caixa-preta”. Para o economista Gil Castelo Branco, da ONG Contas Abertas, a transparência das informações, especialmente estatística, é fundamental para mostrar onde está o problema da lentidão dos processos. “Precisamos saber se as dificuldades estão no Judiciário ou no próprio Ministério Público”, avalia.

Decisões e contestações

Principais decisões do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Algumas foram contestadas no Supremo Tribunal Federal (STF):

2007

· O conselho confirma que integrantes do MP precisam seguir o teto constitucional de R$ 24,5 mil, mas deixa de fora da conta verbas de caráter indenizatório. Em 2006, o ex-procurador-geral da República Antonio Fernando Souza recorreu ao Supremo para derrubar resolução anterior que instituiu o subteto do MP nos estados, de R$ 22.111,25.

· No julgamento do primeiro processo disciplinar desde sua criação, o CNMP pune com suspensão de 45 dias o procurador Luiz Francisco de Souza por exercício de atividade-político partidária. No fim de 2008, o STF concedeu liminar para suspender a aplicação da pena.

2008

· Aprovado relatório sobre a ação do MP em presídios, atribuição que faz parte do controle externo atividade prisional.

· O conselho determina a perda do cargo de promotor de Justiça Thales Ferri Schoedl, acusado de matar a tiros um jovem e ferir outro em 2004. O Supremo concede liminar para manter Thales como promotor.

· Comissão do CNMP faz auditoria nas contas do Ministério Público do Piauí, onde foram constatados casos de nepotismo e promotores que ganhavam acima do teto constitucional, de R$ 24,5 mil. Um promotor ganhava R$ 61 mil.

· Após uma serie de processos, o conselho determina a aposentadoria compulsória do ex-procurador-geral de Justiça de Amazonas Vicente Cruz Oliveira, acusado de contratar pistoleiros para tentar matar um colega, concorrente dele ao cargo de chefe do MP em 2006. Ele também foi acusado de desvio de dinheiro da instituição. Aprovada resolução que proíbe a advocacia por servidores dos MPs estaduais, assim como já ocorria em nível federal

2009

· Aprovada resolução para que o conselho e todos os ramos do Ministério Público divulguem na informações orçamentárias e de pessoal, como os ocupantes de funções gratificadas.

· Norma incorpora a resoluções anteriores a proibição do nepotismo para contratados por empresas terceirizadas.

· O conselho disciplina os pedidos e realizações de interceptações telefônicas. A ideia é uniformizar procedimentos de grampos feitos por meio da Justiça, além de proibir o vazamento de informações à imprensa. No fim de maio, a procuradora Deborah Duprat recorreu ao Supremo para anular a medida sob o argumento de que a matéria deveria ser regulada por lei.

Fonte: Correio Braziliense

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