Correio Braziliense: CCJ aprova PL da discórdia

Projeto que propõe mudanças em relação às escutas telefônicas e ao prazo de prisões, entre outras, segue para o plenário do Senado

A reforma do Código Processual Penal (CPP) aprovada ontem na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado foi criticada por integrantes do governo. O substitutivo do senador Renato Casagrande (PSB-ES) altera prazo de prisões e número de recursos, regulamenta escutas telefônicas e cria a figura do “juiz de garantias” (veja quadro). O Projeto de Lei nº 156/2009 deve ser votado na Casa em abril. Na semana passada, um pedido de vista coletivo na comissão adiou a análise da matéria.

O secretário interino de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça (SAL/MJ), Felipe de Paula, diz que a proposta inova pouco. “Os instrumentos de cooperação jurídica internacional são os mesmos”, exemplifica. São esses mecanismos que garantem agilidade nos processos judiciais em que uma das partes ou mesmo uma prova está em outro país.

O governo sugere mudanças mais consistentes na legislação para autorizar, antes mesmo de o processo ser julgado, o Estado a transferir bens e recursos apreendidos pelo crime para uma conta judicial, nos moldes da lei antidrogas. Dessa forma, evita-se a deterioração de carros e de aeronaves, a oneração do poder público com custos de manutenção e ainda corta o fluxo financeiro das organizações criminosas. Pelo menos R$ 899,2 milhões em haveres e espécie, recolhidos em processos criminais, estão parados em pátios e depósitos por causa da falta de legislação específica. Os dados são do Sistema Nacional de Bens Apreendidos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Um anteprojeto de lei, elaborado pela Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV-Rio) por meio da proposição intitulada Pensando Direito, da Secretaria de Assuntos Legislativos, pode ser encaminhado como forma de emenda ao texto da reforma do CPP. A proposta, em análise pela SAL/MJ, torna os bens do investigado, do acusado, das pessoas ligadas a eles, das empresas e dos “laranjas” indisponíveis. Quando houver risco de depreciação do bem, será determinado o leilão judicial. “Recebemos sugestões, vamos aprimorá-las e o texto poderá servir como emenda”, explica Felipe de Paula. O substitutivo do senador Casagrande prevê três medidas cautelares em relação ao bloqueio de bens: indisponibilidade, sequestro e hipoteca legal.

Para a elaboração do anteprojeto, a FGV-Rio levantou todos os processos em tramitação no Congresso que abordavam a matéria e fez uma pesquisa de campo com magistrados de cinco estados. O resultado revela as dificuldades dos juízes em decretar a perda dos bens por conta das falhas na legislação. A proposta é criar um instrumento único que garanta a segurança jurídica desses pedidos.

O Código Processual Penal vigente no Brasil é de 1941. Uma comissão especial foi criada no ano passado no Senado para discutir as mudanças. Em dezembro, o grupo apresentou o relatório final. O texto segue agora para o plenário. “A reforma de qualquer código exige um debate mais amplo, o que não ocorreu neste caso”, queixa-se Felipe de Paula.

Opiniões divididas

Para o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), qualquer inovação que acelere o processo penal é “bem-vinda”. Apesar de não conhecer os detalhes da matéria aprovada, ele disse ser favorável à novidade do juiz de garantia. “Isso tem uma vantagem grande, pois aquele que colhe as provas não fica comprometido com elas, que poderão ser analisadas de forma isenta por outro juiz”, completou Lewandowski.

O ministro também considera positiva a regulamentação das interceptações telefônicas. Para ele, o assunto deve ser abordado com “muito cuidado”, pois trata da invasão de intimidade e de privacidade. “Existem valores que devem ser ponderados. O legislador ponderou dois valores e optou por privilegiar essa garantia constitucional da intimidade e da privacidade.”

Ampliação rejeitada

Também ontem, a Comissão de Constituição, de Justiça e de Cidadania (CCJ) do Senado rejeitou, por 17 votos a 14, o projeto de lei proposto pelo Executivo que ampliava as possibilidades de ação civil pública. O objetivo era garantir a proteção das áreas da saúde, da ordem social e financeira, dos transportes coletivos e da segurança pública, entre outras.

Novo Código de Processo Penal

Confira algumas das mudanças propostas no projeto aprovado na CCJ do Senado

· Juiz das garantias: É responsável pelo controle da investigação criminal e por guardar os direitos fundamentais do acusado. Não caberá a ele julgar o caso.

· Modelo acusatório: O juiz fica proibido de substituir o Ministério Público na acusação e de levantar provas. É responsabilidade do Ministério Público formar provas. Também garante, na investigação criminal, o sigilo.

· Interceptação telefônica: As escutas somente serão autorizadas em crimes cuja pena máxima for superior a dois anos, casos de infrações de médio e grave potencial ofensivo, salvo se a conduta delituosa for realizada exclusivamente por meio dessa modalidade de comunicação ou se tratar-se de crime de formação de quadrilha ou bando.

O prazo da interceptação não deverá exceder 60 dias, podendo chegar, por meio de pedido de prorrogação, a 360 dias ou mais.

· Fiança: Para as infrações penais cujo limite máximo da pena privativa de liberdade seja igual ou superior a oito anos, o valor da fiança será fixado entre um e 200 salários mínimos. Nas demais infrações penais, de um a 100 salários mínimos.

· Habeas corpus: O habeas corpus passa a ser limitado, podendo ser usado em situação concreta de lesão ou ameaça ao direito de locomoção.

Também não poderá ser usado nos casos em que houver recurso com efeito suspensivo.

· Regras para prisões: A prisão provisória fica limitada a três modalidades: flagrante (quando é detido cometendo a ação), preventiva (de no máximo 180 dias, se decretada no curso da investigação, ou 360 dias, se decretada por ocasião da sentença) e temporária (somente deverá ser usada se não houver outra opção). Não haverá emprego de força, como a utilização de algemas, salvo se indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso

Fonte: Correio Braziliense

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