Correio Braziliense: Imposto da discórdia

Ministros do Trabalho e do Planejamento divergem sobre o desconto de um dia de salário no contracheque dos servidores.

A cobrança do imposto sindical dos servidores públicos federais está no centro de uma disputa ideológica que divide sindicatos e coloca em lados opostos integrantes do primeiro escalão do governo.

Baixada em setembro do ano passado pelo Ministério do Trabalho, a que determina o recolhimento da contribuição referente a um dia de serviço ainda não teve efeito prático. O Ministério do Planejamento, que é contra o desconto, estuda como o dinheiro arrecadado será distribuído entre as entidades representativas.

Na esfera da União, estima-se que Judiciário, Legislativo e Executivo somem juntos algo em torno de R$ 80 milhões. No rateio previsto em lei, 60% iriam para os sindicatos, 15% para as federações, 5% para as confederações, 10% para o governo e 10% para as centrais — seguindo a mesma lógica aplicada à iniciativa privada.

O imposto sindical é compulsório, cobrado em abril e está na CLT. O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, afirma que os sindicatos ligados ao funcionalismo só não recebem a verba porque não estão legalizados no ministério. Lupi assinou a medida em 2008 atendendo às pressões de setores que, embora criticados, defendem a cobrança como forma de garantir a sustentabilidade financeira de entidades que não têm outras fontes de financiamento. “A maioria está contribuindo. O problema é que alguns sindicatos não estão legais. Só falta se legalizarem e fazerem a documentação para terem direito ao recursos”, diz o ministro.

A cobrança, conforme o Ministério do Trabalho, se estende também a estados e municípios. Nos bastidores, Carlos Lupi é atacado por ministros que têm bom trânsito com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em especial, colaboradores que fizeram carreira ou se identificam com bandeiras históricas levantadas pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) classificam o imposto como algo “maldito”, nocivo à legitimidade e à independência dos sindicatos.

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, e a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, por exemplo, discordam radicalmente de Lupi. “O problema é que não há unicidade sindical no funcionalismo”, resume Antônio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Entidades que representam os servidores federais descartam o patrocínio. A maior parte deve recusar o dinheiro formalmente na Justiça, caso a orientação do Ministério do Trabalho passe a vigorar. “Somos contrários. Por ser compulsório, o imposto acaba alimentando entidades fantasmas”, afirma Roberto Policarpo, coordenador-geral do Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União no Distrito Federal (Sindjus).

Os funcionários da Justiça recolheriam cerca de R$ 10 milhões por ano. No Legislativo, onde a estimativa chega a R$ 20 milhões anuais, o discurso é semelhante:
“Vivemos bem com o que arrecadamos”, justifica Magno Mello, presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e Tribunal de Contas da União (Sindilegis). Entre os servidores do Executivo a indisposição é a mesma. “Temos imposto demais no Brasil, não precisamos de mais um. A categoria deve contribuir voluntariamente. O ministro Lupi está equivocado e apegado ao passado”, completa Josemilton Costa, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef). No Executivo federal o recolhimento seria de R$ 50 milhões.

Dinheiro bem-vindo

A Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB), que tem bases em estados e municípios, é favorável ao desconto no contracheque do funcionalismo e até já se posicionou publicamente pela aplicação integral e imediata da norma do Ministério do Trabalho.

Sebastião Soares, secretário-geral da CSPB, explica que o dinheiro é uma contribuição valiosa porque ajuda a manter os sindicatos que não têm estrutura para atuar.

Apesar de o ministro Lupi dizer que a cobrança está em curso, Sebastião Soares afirma que muitos governadores e prefeitos avessos ao imposto ainda não orientaram seus secretários de Fazenda a fazerem o recolhimento. “Poucos recolhem e os que recolhem não repassam a quem de direito, preferem depositar em juízo e aguardar uma decisão sobre o impasse”, acrescenta o representante da CSPB.

O advogado trabalhista Amauri Mascaro Nascimento esclarece que a instrução do Ministério do Trabalho não dá a segurança jurídica necessária para que o recolhimento seja autorizado, por isso os governos federal, estaduais e municipais hesitam em autorizar a cobrança. “O melhor seria uma lei”, diz. Segundo ele, o fato de, no funcionalismo público, não haver categorias de trabalhadores segmentadas e bem definidas, como há no setor privado, é o maior impedimento à tese do imposto sindical na administração pública. “Essa matéria será contestada nos tribunais até chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF)”, reforça.

Palavra de especialista
Proposta alternativa

Sou contra o imposto sindical. O Ministério do Trabalho prometeu encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei em substituição a ele, mas isso não prosperou. Discutir essa proposta alternativa ao imposto é mais importante. O Brasil é o único país do mundo onde existe o imposto sindical. Há muitas questões jurídicas envolvidas que também merecem ser analisadas.
Walter Barelli, ex-ministro do Trabalho

Lupi quer

O ministro do Trabalho editou a polêmica regra com base na legislação, transferindo para o funcionalismo conceitos amadurecidos na iniciativa privada. Em seu artigo 1º, a instrução normativa indica que “os órgãos da administração pública federal, estadual e municipal, direta e indireta, deverão recolher a contribuição sindical prevista no art. 578, da CLT, de todos os servidores e empregados públicos, observado o disposto nos artigos 580 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho”. (LP)

Fonte: Correio Braziliense

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